Subir ao Monte Parnaso - o Monte Farinha
Por: Costa Pereira.
Aonde quer que vá parar em tempo de férias costumo sempre idealizar um ou dois arrazoados de circunstância para depois publicar em qualquer jornal da região visitada, quando não num daqueles já habituados à minha desajeitada prosa.
Este ano alapei-me uma vez mais junto da duna e mar remexido do velho arrais ti Mira, o lobo da onda que, segundo Aquilino, era o "tipo acabado do antigo fenício sóbrio e aventureiro". Cada vez mais familiarizado com a geografia humana, histórica e paisagística deste recanto leiriense que o silencio poético do Lis e a suave brisada Mata do Urso cala para dar voz ao vaivém da salgada espuma e cantarolar da cigarra, engendrei um artiguelho sobre a Bajouca e outro sobre terras da Sertã cuja publicação confiei sucessivamente ao semanário de Leiria, O Mensageiro, e ao quinzenário bombarralense, Noticias do Bombarral; sobrando ainda espaço para redigir o presente parecer que a leitura de um qualificado trabalho de Jaime Cortesão pede a respeito da região de Basto.
"Quem vai para o mar, aparelha-se em terra", ensinou-me o "Zé Cego" do Pedrogão, a utilizar a máxima. Ora eu que vim, como viram, disposto a não tostar demasiado a pele ou perder a mobilidade cerebral devido à inércia física; tive, para evitar contágios, que me imunizar adequadamente com a exigida terapêutica duma boa leitura, por acaso descoberta no relato descritivo duma viagem de sonho desde o Velão a Gatão, guiado pelo filho mais ilustre da terra dos Cantanhedes e que nas Fisgas se perdeu...
Com todo o gosto e admiração acompanhei o mestre no passeio idílico que com o poeta brasileiro Murilo Mendes, o Homem de Ançã fez por volta de 1960 a terras de Santa Senhorinhha e a pressa de ir levar lágrimas e flores à campa do Poeta do Marão projudicou no essencial, ao passar distraido pela base do mais majestoso relevo paisagistico da região de Basto sem lhe observar o porte e tecer uma referência. A fim de encontrar esta incompreensivel omissão precisei de pôr as minhas faculdades mentais em cuidada actividade até encontrar pela lógica justificação explicativa para a miopia e desatenção de tão apurado retratista da terra e do homem português. Penso que descobri a razão da falta cometida pelo insegne historiógrafo e daí lhe desculpar a irreverência para com o Monte Farinha.
Quem de terras distantes entra pela primeira vez as fronteiras de Basto só fazendo-o pelo lado de Fafe ou Amarante dá de caras imediatamente com aquele assombroso cone
orográfico que entre o Tâmega e Cabril se afunila em direcção ao ceu para atingir os quase mil metros de altitude, e como prémio lá no cume sustentar erguida por coroa e feudo seu a ermida do Monte Farinha. Não foi este o trajecto escolhido por Jaime Cortesão quando, pelo Velão, maravilhado viu surgir no panorama paisagistico o aspecto símile de Delfos e, atraido pelo encanto, deu consigo nas arrepiantes Fisgas de Ermelo, que parece lhe atrofiaram o sistema de retenção memorial, visto ficar sem capacidade para fixar o nome do rio OLO como da transcrição se percebe: "No caminho para Mondim de Basto, da ponte sobre o Culo, avista-se ao fundo a longa cascata, em que o rio cai da serra do Porco. Nos primeiros dias de Maio, engrossada pelas chuvas da invernia a cascata assume uma selvática majestade. Mete-se pela estrada florestal à direita; o automóvel pára a 200 metros das Fisgas, estranha panóplia de longas lanças de xisto, varanda rústica sobre que é preciso arrastar-se para admirar a cascata". Não fora trocar o nome do rio e de ter inventado à origrafia local mais um topónimo (porco) a descrição tinha jus a figurar gravada a letras de ouro na polida "fraga amarela", assim apenas mereceu o meu comentário.
Perturbado pela espectacular visão da Cabrilada e ânsia de respeitar projectos agendados, o forasteiro ilustre retoma viagem pelo vale do Olo até próximo de Paradança donde ensombrado pelos montes do Toumilo passou alheio ao relevo que ali começa a ver-se crescer em cone. Não asseguro, mas tenho a impressão que, fascinado, só acordou quando de costas para Trás-os-Montes deu consigo fora do mágico cenário donde acabou de sair "De Mondim de Basto para Amarante por Fermil e Celorico, à beira do Vale uberrimo do Tâmega, estamos de novo em pleno Minho, numa estrada báquica , ladeada pelos tirsos verdes das uveiras, e donde, de quando em quando, correm bandos de perdigotos, maçarocas ainda mal pintadas, a escorregar-se no mato".
O maravilhoso circuito turistico tinha por objectivo homenegear a Serra do Marão e o seu Poeta, Teixeira de Pascoais; mas este, como eu, lamenta que os seus amigos tenham descoberto a Delfos portuguesa sem subir ao monte Parnaso, o Monte Farinha.
In O POVO de BASTO, de Novembro de 1991.
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JUNTA de FREGUESIA de
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